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...nova.
Nem bonita nem feia, nem grande nem pequena, nem muito alegre mas também nenhum pouco triste. Era uma casa nova ainda. Com um longo caminho pela frente.
Essa aqui continua na ativa por enquanto. Porque quando a gente não se acostuma com o colchão novo acaba mandando trazer de volta o velho.
Somos hoje aproximadamente um sexto do que éramos quando este blog existia. Leitor é assim: a gente leva anos pra conquistar e dias pra perder pra sempre. O que eu esperava, não é mesmo? Depois de todo este abandono?
Acho que é o mesmo que eu esperava depois de cinco anos fora: que o mar fosse se abrir pra gente passar. Que um celular novo fosse brotar no meu bolso, que algum proprietário fosse me implorar pra eu alugar o apê dele, que no meu trabalho me convidassem pro melhor posto, no horário de trabalho mais conveniente.
Chegar é difícil pacas. Só não é pior que partir.
Então estou chegando, e esse gerúndio está quase no fim. Não porque eu queira - ou saiba - terminar de chegar, mas porque as coisas vão pra frente mesmo, que afinal de contas é esse o sentido inexorável da vida.
Aprendi nessa volta que não há voltas. Que quando voltamos tudo saiu do lugar onde deixamos, inclusive e principalmente nós mesmos. É tudo uma questão de reinvenção, não de reencontro. E é por isso mesmo que, exatamente como eu já desconfiava, esse blog está prestes a acabar - para que outro possa nascer.
Wish me luck. Eu faço o mesmo por vocês - os poucos queridos que restaram e que continuam aparecendo por aqui absolutamente e inexplicavelmente todos os dias.
Até loguinho.
Eu devia ter aprendido essa palavra numa aula de biologia, no segundo grau. Mas foi no meu mestrado em literatura que eu retive o que quer dizer um rizoma: raízes múltiplas, frequentemente aéreas, como as das orquídeas e das samambaias - em oposição às raízes profundas, estanques e únicas.
Edouard Glissant (que leu Deleuze), o teórico do pós-colonialismo que a minha professora gostava de citar, explicava que no mundo de hoje as culturas se entrelaçam, se misturam, às vezes explicitamente, numa experiência vivida em culturas diferentes, às vezes discretamente, no escurinho de um filme iraniano que te toca sem você saber, de uma música africana que te move sem que você entenda porque. Nossas raízes são múltiplas, subterrâneas ou aéreas, finininhas, móveis, flexíveis, não são duras nem estanques.
Eu voltei pra minha terra. Não sem dor, arranquei meus rizomas múltiplos do betume parisiense e ofereci a eles a terra vermelha, que nem anda tão seca assim. Minhas raízes continuam múltiplas, bifurcadas, leves, finininhas, curiosas, ávidas por água e por novas conexões. Eu sou uma orquídea e sou uma samambaia.
Toda santa vez que a minha amiga alemã fala déménager (mudar-se) eu entendo démélanger - uma palavra que, se existisse, significaria algo como desmisturar.
Não sei se é o sotaque alemão falando francês ou, mais provável, se são os meus ouvidos brasileiros ouvindo o francês de uma alemã que promove esse fenômeno fonético, mas o fato é que a gente não pode falar sobre o meu monotema sem que eu mergulhe em elucubrações filosófico-lexicais.
Eu escuto démélanger e imagino - quase posso ver - um emaranhado de fios coloridos bem misturados sendo desenredados um a um. Puxo um deles e desaparece o hábito de comer iogurte com geléia. Com outro, as palavras francesas que incorporei ao meu vocabulário. Mais um e desaparecem os meus amigos que conheci em Paris. Ainda outro e somem minha coragem de andar de bicicleta, as mal-tocadas notas que aprendi no piano ou, pior, o tempo, o prazer, a realização que vêm do meu reencontro com o desenho. Todos os meus piores medos habitam nessa palavra que eu escuto errado.
Até que me dei conta que esse ato de desemaranhar fios tem outro nome em francês. Se chama démêler. Démélanger não existe mesmo - justamente porque é um ato impossível. Não se tira o chocolate misturado no leite. Uma vez feito o verde, não se separa mais o azul do amarelo. Desmisturar é impossível. E vocês não tem ideia de como isso me soulageou.
Já foi ver a Pictoplasma, na Gaité Lyrique? Tem um desenho meu no quadro grandão, um dos quinhentos selecionados entre mais de cinco mil desenhos submetidos. Se você quiser, pode deixar a sua contribuição sobre como imagina seu monstro. A ideia é mostrar como os medos do mundo inteiro são representados agora que o planeta ficou pequeno e todo mundo fala a mesma língua. Eis o meu monstro, que não mete medo em ninguém.
Por que não existe um botão mental que permita de publicar posts no blog sem precisar parar, escrever, desenhar? Direto da ideia para a rede, para poder dividir com vocês todas as emoções, impressões, expectativas que estão fazendo parte desses dias loucos sem precisar dispensar o tempo que isso exige...
Penso em vocês sempre e voltarei em breve com mais conteúdo e menos chororô. Até lá, desejo feliz tudo a todos. ♥!