sexta-feira, março 20, 2009

Quase primavera

Desde o início do mês que eu espreito as copas das árvores que ficam na altura da minha janela. Nada na primeira semana. Nada na segunda. E de repente, sexta-feira passada, lá estavam eles – os primeiros brotinhos que logo se transformarão em folhas, espalhando a primavera Paris afora. Ainda são tão pequenos, frágeis, de um verde claro e tenro, improváveis naqueles galhos que parecem secos. São o prelúdio de uma primavera que me soa como o grito de terra à vista.

Há esperança, me dizem as quase-folhas. Já não é preciso vestir três camadas de roupa para sair de casa, em pouco tempo sandálias e bermudas estarão de novo se oferecendo para sair do guarda-roupa. Os gramados dos parques vão deixar o repouso imposto durante o inverno e serão invadidos por hordas de crianças e demais seres felizes em geral, que vão se deitar, vão almoçar, vão ler, vão se beijar sobre eles.

Os dias, que já readquiriram sua duração normal das sete às sete, ganharão pouco a pouco mais preciosos minutos, até conquistarem a noite. Os terraços dos bares e cafés vão parecer a extensão das nossas casas, chopps (menos gelados do que deveriam) vão se insinuar para turmas animadas de amigos, sugerindo um happy hour que só vai acabar quando o sol finalmente for embora, quase de madrugada.

As crianças vão parar de ter uma gripe atrás da outra. Meu vizinho defronte vai instalar uma mesinha de meio metro de diâmetro na sua varanda de setenta centímetros quadrados, tão pequena que só cabe a felicidade de almoçar ao ar livre e nada mais. Eu, que não tenho varanda mas tenho janelas, vou escancarar todas e sentir o vento. Vou dormir no vento. Sem calefação e sem ar condicionado, sem nada que não seja o vento.

A prefeitura vai construir a réplica de uma praia às margens do Sena, como acontece todo ano, e como todo ano isso vai ser ao mesmo tempo legal e um pouco tosco. Vai haver shows ao ar livre e eu vou tomar sorvete de caramelo de manteiga salgada da Berthillon. As francesas vão se vestir de um jeito estranho e extravagante, sem saber direito como combinar as cores. E, bom, algumas pessoas vão realmente cheirar mal – simplesmente porque elas vão se esquecer que o casaco finalmente é desnecessário agora.

As pessoas do metrô vão sorrir de vez em quando – assim, do nada. Quando esbarrarmos nelas e pedirmos desculpas, elas vão dizer que não é nada, ao invés de grunhir, que é o que normalmente acontece. E daqui a três meses, quando o verão chegar, será a Fête de la Musique e Paris vai viver o seu carnaval.

Logo será primavera em Paris, depois de um longo e caprichado inverno. Que seja eterna enquanto dure.

(Este é o texto da semana no Blog do Noblat, que reflete tanto meu atual estado de espírito que quis trazer pra cá também. Quem não tem medo de emoções fortes e quer vê-lo publicado por lá, clica aqui).

14 comentários:

Mari disse...

Texto no tempo mais que perfeito!!!
Finalmente! Esta primavera ja vem tarde!!!!
Viva a galera pegando sol de sunga à beira do Sena, viva os passarinhos tomando banho na poça, os shorts ainda fora de contexto, viva os cachecois obsoletos!!!!
e principalmente...
Viva o pic-nic na relva!!!!
BOA PRIMAVERA PARA VC CAROL!!!

Anônimo disse...

:)

G disse...

dorei! to com a mesma sensação aqui do lado de cá! ;-)

Anônimo disse...

ai, a primavera!! coloca água no feijão, eu tô chegando! beijo, sua mana. :)

Anônimo disse...

Como o Noblat tem amigos estressados... Credo!!!

Amanda Lourenço disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Amanda Lourenço disse...

Que alívio saber que minha chegada no CDG domingo será diferente da minha partida, de baixo de neve, ha dois meses! Viva a primavera!

Chéri disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Chéri disse...

Eu, hein? Que comentários são esses no blog do Noblat?

A gente passa frio e os outros é que ficam de mau humor? Coisa mais estranha...

Beijocas já esquentando!

Felipe disse...

Tô de cara com os comentários por lá. Acaba que o resumo do seu perfil chama muito mais a atenção do que os próprios textos. Nego se acha "vigilante" em ficar questionando o seu emprego. E o saco é que, como os leitores se reciclam, nem todo mundo leu seu post explicativo e agora fica querendo questionar - o que é compreensivel ate certo ponto, diga-se -, mas de forma leviana e, acho, grosseira.

Veja, eu mesmo aqui nem falei da primavera.

Ate porque frio pra mim é em festa junina de noite aqui, quando uso uma jaqueta sob frio polar de 18 graus.

Beijocas

machay disse...

Lindo.
Viajei na leitura do texto.
Quando se tem as estações tão definidas a primavera vira poesia.
Já conheço até seus vizinhos defronte. São aqueles da foto de um texto passado? rsrsrs.Boa primavera com ótimos picknick para vcs.

Anônimo disse...

É muito legal ver, pelos olhos dos amigos, coisa que a gente aqui nem imagina como é! As quatro estações do ano assim tão definidas? Pra mim, isso muda até a cultura das pessoas! Adorei mais esse post, Carol! E, quanto aos seus leitores do blog do Noblat - não todos, claro - o mau humor beira a ignorância. Me chocou. Que bom que nem por isso vc se deixa abalar! Força na peruca, amiga!
Cheiros saudosos pra vcs quatro!

Alécia

Mari disse...

Prima, eu que estou à tempos nessa mesma expectativa, fiquei chocada ao acordar hoje e perceber que está nevando aqui! :( Nevando na primavera!!! Muito triste isso!

Adorei o post, como sempre!

Beijos em todos! Mari

Gustavo disse...

Carol,

fala para o Alberto me responder o email, por favor!!

Seu marido eh muito ocupado, aff!!

Seu blog eh bacana demais. Parabens!

Abs

Gustavo, Cris e Bruna