quarta-feira, abril 15, 2009

Bibliofilia cármica

Olho ao redor. Um está concentrado no livro. O outro mexe com a caneta enquanto pensa. A outra pensa na vida enquanto mexe a perna. Silêncio. O cheiro reconfortante de livros velhos mas limpos, identificados, encapados, preservados. Um murmúrio de conversa lá no canto da sala, que não me incomoda, ao contrário. Adoro tudo. Não há lugar no mundo em que eu me sinta tão automaticamente em casa como numa biblioteca.

Freud explica com certeza, é o conforto do útero das minhas memórias de pequena. Minha mãe é bibliotecária, o que eu considero a profissão mais bacana que uma mãe pode ter. É para cá que eu vinha toda vez que a empregada faltava - e eu torcia para ela faltar. Claro que não exatamente para cá, mas dá no mesmo.

Quando parei de ir pela obrigação da falta da babá, passei a bibliotecar por opção – muito mais fácil se concentrar longe da televisão, do telefone. No segundo andar do anexo da Caixa ficava minha preferida em véspera de prova: caixotes individuais, luz boa, ventinho e biscoito Bono comprado no baleiro da porta do teatro. Na deliciosa bibliotequinha da 312 eu aprendi tão bem aprendido sobre os celenterados, poríferos, aracnídeos e afins que não só tirei nota alta na prova como até hoje me lembro do nome do oco no meio da esponja do mar: átrio.

Não faz mais sentido fugir do telefone nem da TV. Aqui estou eu, na biblioteca, com o telefone mudo ao lado e a irresistível wifi se insinuando para mim, de graça. Meu buraco é mais embaixo: é dos meus pequenos, de sua abençoada energia e e irresistível alegria que eu tenho que me esconder quando preciso estudar. Meus filhos me trouxeram de volta às bibliotecas da vida, e eu gosto de achar tudo isso meio cármico.

7 comentários:

Anônimo disse...

E é cármico! Que eles possam se ssentir tão à vontade em meio aos livros quanto vc. Beijos :)

Cibelle

Anônimo disse...

mas você não me engana: essa estante povoa a linda residência dos nogueira da costa lima! e eu tô levando na bagagem mais um daqueles que estão virando minha especialidade!! :) vou tentar terminar no caminho, e deixo contigo! combinado!? um beijo do tamanho da saudade! sá.

Anônimo disse...

Adoro o seu blog!
Me identifico muito com o que vc conta, pq tambem moro em paris e no 16eme!
Achei muito engraçado a historia do pessoal deitado na grama pq passei na semana passada pelo Jardin des Tuileries e estava todo mundo tomando sol... Felicidades pra vc e sua familia

Um abraço

Mari

Anônimo disse...

coisa linda de mãe. já imagino a quantidade de historinhas lindas que os pequenos vão contar só baseadas naquelas que eles costumam ouvir. beijo da tia bella que tem um monte de livros legais na estante e sente saudade também das bibliotecas cheias de ácaro do bacen e do frio da unb.

Solange disse...

Meu sonho era ser bibliotecária, e minha mãe chegou a trabalhar na da câmara, mas temos uma alergia braba a papel :(... A minha preferida era a da UnB: o subsolo para 'papear', o andae do meio para pesquisar e o de cima para 'estudos pesados' :D
(Já cheguei a te contar que quase morei aí quando tinha 12 anos? Fico revoltada com o 'quase' até hoje...)

Anônimo disse...

Carol, você é um luxo! E vai muito, muito longe mesmo! Um beijo e parabéns pelos três textos: sobre as bibliotecas (também tenho paixão e minha mãe também é bibliotecária, por culpa minha), sobre a morte e a perda de pessoas queridas, e sobre o papel dos leitores. Tudo 100%! Repito, você é um luxo! Sandra

Anônimo disse...

Ca,
domingo de tarde, a turma vendo FlaXBota e eu aproveitando pra ver seus textos novos, que ja me fizeram chorar, ficar triste e alegre de novo ao reler sobre as bibliotecas na sua vida...muito bom...e cá estou eu aqui de novo, trabalhando numa delas... Quando voces voltarem quero ir à Biblioteca Nacional de Brasilia (esquisito isso, ne?) com voce e os meninos para conhece-la..bem mais humilde do que a BNF mas é uma grande conquista para Brasilia e para brasilienses como voce, que valorizam e tem amor às Bibliotecas..beijos. Te amo, Di Mãe