Acho que eu nunca tinha parado para pensar em como seria Berlim antes de ir visitá-la. Não tinha uma imagem formada - mas morando em Paris e visitando eventualmente outras capitais européias, imaginava encontrar mais do mesmo: catedrais medievais, prédios centenários.
Certamente estou falando o óbvio para a maior parte de vocês, mas Berlim não é nada disso.
Berlim é uma ilha de ultramodernidade num mar de relíquias históricas do resto da Europa. A cidade com a noite mais fervilhante do continente tem prédios arrojados, monumentos pautados pela arte contemporânea, tudo temperado pela qualidade tipicamente alemã.
Escombros do muro são a herança viva de uma revolução feita pelas mãos do povo - numa luta de mãos e marretas contra o concreto armado, um movimento físico de luta pela liberdade que é ao mesmo tempo quase expiatório.
Não são só os pedaços de muro, conservados principalmente em Potsdamerplatz, que fazem lembrar a divisão forçada pela guerra fria, que separou famílias e amigos. Em toda a cidade, um tracejado pintado pelas ruas e calçadas relembram o traçado que durante 28 anos representou a fronteira mais importante do mundo.
E por que isso me faz pensar em Paris?
Acontece que Paris está de pé. Toda de pé. Felizmente, pelo bem da história e das futuras gerações, todos os prédios centenários de Paris estão aqui, testemunhando com cada uma de suas pedras eventos que se passaram mais de dez séculos atrás.
De Berlim não se pode dizer o mesmo.
A França colaborou com o governo alemão durante grande parte da Segunda Guerra Mundial. Sua população sofreu nas mãos de uma ocupação generalizada, mas que - como bem documentou a polêmica exposição fotográfica de André Zucca, exibida no ano passado aqui em Paris - conservou em certa medida uma vida mais ou menos normal: com mocinhas seguindo a moda e rapazes andando de bicicleta.
Quando os aliados apertaram o cerco contra o governo nazista, os franceses já tinham mudado de lado. Ainda que certamente atingido pelos efeitos de uma guerra que atravessou seu território, o patrimônio físico francês - e especialmente de sua capital - saiu bem pouco marcado pela mais terrível guerra da história. Ou melhor dizendo: saiu bem menos marcado do que Berlim, palco principal da guerra e de todas as suas consequências.
Quando ousei falar a uma amiga - talvez extrapolando um pouco - que o Louvre era um monumento ao entreguismo francês, ela respondeu com um conselho que durante a vida toda ouviu de sua avó, francesa como ela: que as novas gerações dobrem a língua para falar da guerra.
Certo, língua dobrada: mas pensar sobre isso - e sobre o preço que desejamos pagar por nosso papel de liderança, a comodidade de nossa vocação pacífica e qual o nosso compromisso com a história - não custa nada.
PS: Acertou quem pensou que esse é o post da semana no Blog do Noblat. Nem sempre eu acho que o que eu digo lá combina com o que eu digo aqui. Mas isso eu achei que sim.
8 comentários:
A França foi muito amadora na guerra. Colocou todo mundo na fronteira com a alemanha e esqueceu da bélgica. Foram derrotados mais facilmente do que meu time infelizmente é hoje no Brasileirão.
Essa frase da sua amiga é apenas uma desculpa dela -coisa de quem não reconhecer os próprios fracassos.
Berlim inspira né Carol?! Eita cidade incrível...inexplicável morar lá. Se os franceses não querem te ver falando de guerra, nem pense em tocar no assunto com os alemães!
Adorei o post. Beijim, sds.
Esse pé é seu?
Não! Esse pé é do Pepê! :)
Adorei o post amiga! senti a mesma coisa quando fui pra Berlim.
Saudades :-(
Carol, Berlim foi uma surpresa muito agradável pra mim. Dentro do meu mundinho tosco, sempre achava que o alemão era o contrário do que vi lá. E enquanto os EUA provocam guerras irracionais e nem se desculpam pelas bombas atomicas de Hiroshima e Nagasaki, a Angela(primeira ministra) se desculpa pelos alemães publicamente, toda hora..Humildade faz parte da honradez..Bjs, Di
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